18/09/2012

Discurso na Câmara Municipal de Caçapava


DISCURSO NA SESSÃO ECUMÊNICA NA CÂMARA MUNICIPAL DE CAÇAPAVA

18 DE SETEMBRO DE 2012.
 “VERBUM DOMINI”


Reverendíssimos Padres;
Revendo Pastor;
Excelentíssima Sra Presidente da Câmara,
Reverendíssimos Diáconos,
Demais autoridades,
Estimado Povo de Deus,


         Esta sessão solene que marca há tantos anos a caminhada desta casa de leis, bem como de nossa realidade eclesial-ecumênica, reveste-se de grande júbilo, pois, temos a oportunidade de voltar nossos olhares a Bíblia, livro que contém a Palavra de Deus anunciada, acolhida, vivida e testemunhada ao longo da história.
         Gostaria de lançar três olhares sobre a Palavra de Deus, tendo como base, a exortação pós-sinodal  Verbum Domini, do Santo Padre, o Papa Bento XVI. Pensemos a Palavra em Deus, na Igreja no mundo.

1)   Verbum Dei (A Palavra em Deus)

O evangelista João, presenteia-nos na abertura dos seus escritos, com seu prólogo: “No princípio já existia o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus e o Verbo se fez carne” (Jo 1,1.14)
Com estas palavras descritas na narrativa de João temos alguns princípios fundamentais, de que a Palavra (O Logos) ela é pré-existente, acontece antes mesmo da criação. A Palavra será a marca da realidade trinitária. Pai-Filho-Espírito Santo comunicam-se por esta Palavra pré-existente, e o mais importante, é de que este Logos não é apenas um vocábulo, é o Amor na sua essência. Assim este Logos, Palavra, revela a intimidade divina. Dialogam sob a forma do Amor. Compreendendo isso, podemos dizer de que, a primeira maneira de entender a Palavra em Deus, é senão pela simplicidade e a profundidade amorosa que cada pessoa da Santíssima Trindade tem de um para com o outro.
A Força deste diálogo intradivino, acontecida no Amor, não permanece somente no mistério, mas por ser Palavra-Amor, transborda em favor da realidade humana. Há um desejo divino: dialogar com o ser humano. Não basta uma palavra que provoque ação apenas na realidade divina. Deus escolhe o “ser humano” como lugar desta ação e por isso, a palavra torna-se o lugar do diálogo, da intimidade do divino com o humano e do humano com o divino.
João nos afirma: “E a Palavra se fez carne e habitou entre nós”. O desejo e ação dialogal do Divino são concretizados no mistério da Encarnação. Não quero aqui esquecer que a Palavra antes de “habitar entre nós”, tornou-se ação no Antigo Testamento: “Ele falou pelos profetas”.
Na Antiga aliança a Palavra é vocábulo que expressa a constituição de um Povo, é chamado, intervenção, condução, Lei, libertação, mas acima de tudo sinal de proximidade e envolvimento divino.
Cristo, Verbo Encarnado: Não nos esqueçamos de que o Amor marca o diálogo intra-divino e expressa a identidade da mesma. Com isto, é fácil entender que Cristo, o Lógos encarnado será essencialmente expressão desta “Caritatis Dei”, ou seja, do Amor divino.
Pelo Cristo, expressão autêntica do universo divino, temos acesso aos “átrios” do Mistério. Mesmo assim os encantos do mistério não se perdem, pelo contrário, despertam em nós o desejo de ir ao mais profundo e tomarmos de suas revelações e dos encantos. Encontrar em Cristo o acesso ao Mistério é desejar, sem medo, lançar-se no abismo de sua vida, que nos coloca na mais alta realidade, o céu.  Aproximar-se, envolver-se com a Palavra Encarnada é efetivamente experimentar o amor divino que preenche o ser humano. Do mesmo modo, não nos cabe a dúvida se a natureza humana do ser divino desqualificaria sua ação enquanto Palavra de Deus. É óbvio que a eficácia da Palavra não está simplesmente na sua natureza, mas naquilo que ela é, principio de tudo.
Recordemos: “Desde a encarnação, a Palavra, já não é apenas audível, não possui somente a voz, agora a Palavra tem um rosto: Jesus de Nazaré”.





2)   Verbum in Ecclesia (A Palavra na Igreja)

         Cristo tem uma presença na vida da Igreja, sua esposa, a comunidade que o escuta e anuncia a Palavra de Deus. Ao enviar os seus discípulos diz: “Ide anunciai a todos os povos” ou ainda “Ide, evangelizai”. A Igreja existe essencialmente para evangelizar, isto é, levar as pessoas a responderem de forma positiva à proposta de Cristo e a assumirem como próprios os valores do Evangelho.
         Acolhendo o mandato missionário, a Igreja, torna-se o âmbito privilegiado onde se encontra e se experimenta Jesus Cristo nas escrituras. Portadora deste Logos-Missionário, a Igreja tem a responsabilidade de testemunhar a identidade amorosa que é senão a identidade divina àqueles aos quais proclama a Palavra. Quanto mais a Igreja anunciar a Palavra como expressão do amor divino pelo ser humano, e um amor que liberta, cura, perdoa, consola, fortifica e conduz às verdes pastagens, isto é, à Salvação, ela estará correspondendo a essencial dialogal que há no coração de Deus.
Por isso, é preciso reeducar os seus membros a encontrar-se com o Cristo Palavra, mas não basta desejar que todos tenham a Bíblia, pois não somos uma religião do livro, mas é preciso que tenham acesso e conheçam a vida de Jesus Cristo, deste modo, a Palavra proclamada na Igreja deve ser entendida como acesso e meio pelo qual se adere ao Logos encarnado. A cada anúncio em suas liturgias, celebrações e trabalhos catequéticos, a Igreja sinaliza efetivamente o coração aberto de Jesus Cristo, acesso único à Salvação.

3)   Verbum Mundo (A Palavra no Mundo)

         A missão da Igreja, enquanto proclamadora da Palavra de Deus não se cumpre apenas na esfera ad-intra (internamente), mas principalmente ad-extra (externamente), fora do âmbito eclesial, ou seja, no mundo.
         “É preciso anunciar ao mundo o Logos da esperança. Em Cristo está a Salvação das Nações”. De fato, o mundo está carente de referenciais. Recorro, a Martin Luther King, que numa célebre frase afirma: “O que mais me preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem ética. O que mais me preocupa é o silêncio dos bons.”
         De fato, como portadores de uma fé encarnada, revelada, cabe a nós, pastores, evolver os fiéis, as ovelhas, as quais o próprio Logos Encarnado nos confiou, deste espírito evangelizador, preparando-os, instruindo-os para anunciar e testemunhar com a vida a ação da Palavra em sua história.
         A Palavra no mundo deve deixar transparecer a realidade de um mundo novo, de um novo modo de conviver, de se aceitar, de respeito mútuo, de valores básicos para o dia-a-dia, por isso, como Igreja, conduzida pelo Espírito Santo, coloquemo-nos cada vez mais nesta atitude missionária. Todos os batizados são responsáveis pelo anúncio e aqueles que de fato deixaram o Cristo penetrar em suas vidas, tem hoje, a tarefa de mostrar aos seus irmãos e irmãs o caminho da salvação, que está em Jesus Cristo.

4)   Conclusão

 Concluo com um poema de Carlos Drummond de Andrade:

Já não quero dicionários cultivar em vão.
Quero só a palavra que nunca estará neles
nem se pode inventar.
Que resumiria o mundo e o substituiria.
Mais sol do que o sol,
dentro da qual, vivêssemos todos,
em comunhão, mudos, saboreando-a”

         Saboreemos o Logos in Dei, in Ecclesia, in Mundo, isto é, em Deus, na Igreja e no Mundo.

         Obrigado pela atenção.


Padre Kleber Rodrigues da Silva
Pároco da Paróquia São José Operário